No último sábado, dia 3 de fevereiro, Uma Thurman finalmente revelou os assédios que o ex-produtor Harvey Weinstein, epicentro do escândalo de abusos sexuais que abalou Hollywood, cometeu contra ela. No entanto, o longo artigo do New York Times fez surgir um "vilão" insuspeito: Quentin Tarantino. De acordo com a reportagem, o cineasta teria obrigado a estrela de Kill Bill a embarcar em um carro com problemas de funcionamento para filmar uma sequência simples que, no fim das contas, acabou causando um acidente quase fatal. Em entrevista ao Deadline, Tarantino esclareceu a situação; revelou que Maureen Dowd, repórter do NYT, não o contactou para comentar a reportagem como combinado; e ainda falou sobre sua relação com a atriz, com quem também trabalhou no clássico Pulp Fiction:
"A ideia era colocá-la para dirigir entre 50 e 70 km/h, só para ter seu cabelo voando. Com as folhagens nas margens da estrada, ela dirigindo a 50 km/h pareceria 100km/h. Mas não haviam obstáculos, era uma cena simples. Entrei feliz no trailer dizendo que ela com certeza conseguiria fazer, que era uma linha reta, que ela não teria problema. E a resposta dela foi... 'Okay'. Porque ela acreditava em mim. Porque ela confiava em mim. Disse a ela que não teria problema. Disse que a estrada era uma linha reta. Disse que ela estaria segura. E isso não aconteceu. Eu estava errado. Não a forcei a entrar no carro. Ela entrou porque confiava em mim. E porque acreditou em mim", contou o realizador, explicando que ele mesmo testou a direção do carro antes da atriz e que, de fato, ficou irritado com a recusa prévia de Thurman a fazer a cena, mas que jamais entrou no camarim da atriz para gritar com ela, como reportado pelo New York Times.
Thurman ao volante em cena de Kill Bill. |
"Foi horrível", prosseguiu Tarantino, "vê-la lutar pelo volante, lembrar de ter dito que era seguro e que ela poderia fazer isso, enfatizando que era uma linha reta, uma linha reta... o fato de que ela acreditou em mim e eu vi simplesmente essa pequena curva em S surgir. E isso a fez rodar. Partiu meu coração. Além de ser um dos maiores arrependimentos da minha carreira, é um dos maiores arrependimentos da minha vida. Por uma miríade de razões [...] Isso afetou minha relação com Uma pelos próximos dois ou três anos. Não é como se tivéssemos parado de nos falar. Mas a confiança foi quebrada. Uma confiança quebrada após um ano de filmagens, depois de fazermos cenas muito difíceis. Depois de fazer manobras complicadas. Queria que ela fizesse o maior número de cenas possível e nós estávamos tomando conta dela e ela conseguiu fazer tudo. Ela não se machucou. E então, nos últimos quatro dias de filmagem, quando pensávamos que seria uma cena simples, ela quase morre".
Ainda, o realizador afirmou que as outras polêmicas cenas de Kill Bill mencionadas no artigo foram realizadas com o consentimento de Thurman: a cena em que a Noiva recebe uma cusparada no rosto, disparada pelo próprio Tarantino; e a sequência em que ela é enforcada pela corrente de Gogo (Chiaki Kuryama), cuja realização foi sugerida pela própria atriz. "Nós estamos bem. Uma está incomodada por causa da revolta que surgiu contra mim. Ela me culpa por não ter conversado com Maureen Dowd, dizendo que é tudo minha culpa. Ela não queria que isso se tornasse sobre mim. Nós temos conversado sobre isso o tempo todo e me sinto mal porque ela está fazendo uma peça na Broadway agora. Conversamos durante todo o fim de semana. Ela não estava preparada para a revolta contra mim. Temos uma história longa e complicada. Nós lidamos com isso pelos últimos 22 anos. Ambos somos algumas das pessoas próximas em nossas vidas", declarou Tarantino, que também auxiliou a atriz a se preparar para a reportagem do NYT, fornecendo a ela a fita do acidente, uma gravação que ele também afirmou não ter sido sonegada dela.
Tarantino, Thurman e Weinstein |
Tarantino, por fim, também relembrou seu confronto com Weinstein, quando obrigou o ex-produtor a pedir desculpas a Thurman para que eles pudessem rodar Kill Bill: "Foi uma discussão insistente. E ficou mais insistente, naturalmente, porque Harvey tentou tirar ênfase das coisas e dizer coisas que não eram a verdade [...] Mas isso não funcionou porque eu sabia que ela não estava mentindo. Não havia outro lado da história. Esta era a história. Harvey era muito bom em dizer que a realidade era isso ou aquilo... e, francamente, você não conhece as pessoas que estão sendo acusadas, você pode dar o benefício da dúvida. Nesse caso, não dei o benefício da dúvida a Harvey. Sabia que ele estava mentindo, que tudo que Uma tinha dito era verdade. Quando ele tentou se safar, dizer o que realmente tinha acontecido, não comprei sua história. Disse que não acreditava nele. Que acreditava em Uma. E disse que ele teria que consertar as coisas se ele quisesse fazer Kill Bill".
Fonte: New York Times , Deadline e AdoroCinema